sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Acordando Acordes

Sempre que ouvia os primeiros acordes do violão, ela corria para a varanda. Morava ao lado, a uma parede de distância; não podia vê-lo. Mesmo assim, sentava-se no chão frio e acompanhava o dedilhar das notas, quase visualizando a figura sentada numa cadeira, braços em volta do violão, olhos fechados, o som produzido desenhando uma paz evidente em sua expressão.
Podia imaginar os dedos longos tocando cada corda com firmeza, sentindo a tensão de cada uma, como se fizessem amor. Parecia conhecer cada acorde, cada som, como se o violão fosse parte dele. Tocava cada compasso como se os dedicasse a alguém. E ela gostava de sonhar que era pra ela. Que cada declaração feita pela melodia era pra ela.
Declarações, mas nem sempre havia letra. Era como um exercício, que ele repetia vez após outra. Estava claro que queria memorizar a sequência, mas parecia que tinha intenção de fazer o ar da noite decorar também. Ela não era o ar da noite, mas sabia tudo de cor. E continuava ali, invisível. Só queria que ele soubesse...
E ele, abraçado ao seu violão, alheio ao fato de que povoava os pensamentos de alguém sentado muito próximo, cantava um sentimento que não conhecia. Não sonhava com esse amor eterno de que falava a canção, só queria encontrar alguém que entendesse sua música. 

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